Volume 8 Número 3 Ano 2007
Autor:Maria Eduarda Rosa
PORTUGAL E GALIZA SEGUNDO AGOSTINHO DA SILVA
Autor: Maria Eduarda Rosa
Galego
“Amor de homem e de mulher com a presença de Deus, eis aquilo a que Portugal e Galiza se encaminhavam no princípio de seu mundo (...)”
Agostinho da Silva [1]

Ao longo dos tempos, muitas têm sido as reflexões efectuadas sobre a Península Ibérica e seus povos, principalmente no que se refere às raízes comuns que nos deviam unir em vez de nos separarem. Há bem pouco tempo, o nosso prémio Nobel da Literatura, José Saramago, chamava à nossa consciência a necessidade de Portugal se unir a Espanha. Entre as personalidades que provocaram essa reflexão, além de Unamuno e outros, destacarei dois grandes poetas nascidos nos Açores: Antero de Quental e Natália Correia.

Antero de Quental, o grande impulsionador do grupo Cenáculo, apresentou, na Segunda Conferência do Casino em 27 de Maio de 1871 [2], três causas da Decadência dos povos peninsulares: o catolicismo posterior ao Concílio de Trento, a monarquia absoluta e as conquistas ultramarinas. Para solucionar esta decadência, propôs opor: ao catolicismo, a consciência livre, a ciência, a filosofia e a crença na renovação da Humanidade; à monarquia centralizada, a federação republicana democratizada; à inércia industrial, a iniciativa do trabalho livre e organizado para o futuro que seria o socialismo.

Natália Correia, no caderno Somos todos Hispanos [3], analisa o erro que foi Portugal dar tanta importância ao Atlântico esquecendo-se das suas fronteiras da interioridade e do Mediterrâneo que partilhamos com Espanha, e aponta personalidades na literatura portuguesa com uma profunda ibericidade como Miguel Torga de quem comemoramos neste mês de Agosto (a 12) o centenário de nascimento. Esta poetisa aponta como caminho a seguir o do bom relacionamento cultural entre os dois povos peninsulares numa reconstituição da Ibéria, com vista à criação da comunidade ibero-afro-americana.
Num ensaio publicado no Brasil em 1957, intitulado “Reflexão à Margem da Literatura Portuguesa”, Agostinho da Silva reflecte também sobre a Península Ibérica e sobre as razões históricas que impediram a sua realização plena. O maior erro teria sido separar Portugal da Galiza, pondo como fronteira o rio Minho a que se seguiram outros “rios de lágrimas” [4].

Se não se tivesse dado esta separação em que Portugal perdeu o seu Norte, o seu complemento a Norte, talvez tivéssemos feito chegar ao Tejo, fruto da descoberta de novos mundos, caravelas com cereais e não com ouro e pedras preciosas. Enquanto Portugal “barcava”, o galego podia ter “arcado”, segundo o dito popular utilizado por Agostinho da Silva.

Mas Agostinho da Silva considera que talvez a História de reintegração da Península, na sua liberdade essencial, seja feita através da reunião de Portugal e Galiza. “Dos dois noivos que a vida separou” [5]. Portugueses e Galegos, segundo Agostinho da Silva no ensaio já referido, são pessoas a quem a acção chama e elas vão; são pessoas que ficaram com saudades do céu, choram na lembrança e sofrem esperando reconquistar o paraíso.

Portugal e Galiza seriam a união superior, andrógina, de amor santificante, sem impulsos destruidores mas sim construidores, como homem e mulher unidos na mesma essência, numa vinda do Espírito Santo consolador.


 1. SILVA, Agostinho da, “Reflexão à margem da literatura portuguesa”, in Ensaios sobre Cultura e Literatura Portuguesa e Brasileira, Vol. I, organização de Paulo Borges, Âncora Editora, p. 33.

 2. QUENTAL, Antero de, Causas da Decadência dos povos peninsulares, 5ª edição, Ulmeiro, Março de 1987.

 3. CORREIA, Natália, Todos somos Hispanos, caderno de O JORNAL, Setembro de 1988.

 4. SILVA, Agostinho da, “Reflexão à margem da literatura portuguesa”, in Ensaios sobre Cultura e Literatura Portuguesa e Brasileira, Vol. I, organização de Paulo Borges, Âncora Editora, p. 34.

 5. Ibid., p.31.


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